Katábasis é uma expressão grega composta por ‘’katá’’, baixo, e ‘’bainis’’, ir, andar. Portanto, a palavra significa ‘’ir para baixo’’, ‘’descer’’. Tal verbete é utilizado na mitologia grega para uma tarefa que todo o herói cumpria: a descida ao Hades, o Reino dos Mortos.
Perseu, por exemplo, visitou o lugar para lutar contra a Medusa. Hércules também visitou o reino dos mortos, assim como Orfeu, para recuperar sua amada Eurídice, foi até lá. A própria Koré, filha da Deméter desceu ao Submundo, onde se tornou rainha. Ainda assim, volta todo o ano para ficar com a mãe.
Mitos onde aparecem a katábasis não aparecem somente na mitologia grega. Na suméria, Ishtar, a deusa da fertilidade, foi ao inferno buscar Dumuzi, seu amado. Propositalmente, no conto que escrevi, A Deusa, o Anjo e a Morte, Ánya, a deusa do mar, também vai para o mundo inferior. Em todos esses mitos, a entidade ou herói retorna de lá com alguma perda, mas com algum potencial novo.
Metaforicamente, a katábasis persiste na literatura recente. Em ‘’O Conde de Monte Cristo’’, de Alexandre Dumas, o jovem Edmond Dantés é incriminado injustamente e vai para a prisão na ilha de Elba. Lá, conheceu um velho bispo, sábio (o arquétipo do Ancião, o Sénex) que o ensinou muita coisa e o ajudou a escapar da prisão. Depois de quase se afogar e nadar quilômetros, Edmond chega vivo a uma ilha onde encontra um tesouro, que pertencia ao abada que era seu colega de cárcere. Fica milionário e volta para sua cidade para se vingar dos que lhe causaram mal.
No Brasil, temos ‘’Tieta do Agreste’’, de Jorge Amado. Tieta, após se envolver em um escândalo sexual na cidade cri-cri de Santana do Agreste, é expulsa de casa pelo próprio pai. Sem saída, ela se muda para São Paulo, onde se prostitui e vira uma cafetina, ficando muito rica. Depois de anos, é dada como morta pelas pessoas de sua cidade natal. Quando volta, chocando toda a cidade que pensavam que ela havia falecido, causa polêmica, mas revoluciona o lugar.
Quem assiste à novela Insensato Coração já deve ter visto a Norma. Depois de passar algum tempo na prisão, sai, fica rica e quer se vingar do homem que a botou atrás das grades. Contudo, o mau gosto do autor, ao que parece, está fazendo ela se apaixonar pelo Léo.
O ‘’mito’’ de Katábasis mais recentemente divulgado é o de Luisa Marilac. O travesti, mudou-se para a Europa. Depois de perder tudo para um homem que a roubou, recuperou o dinheiro, enriqueceu e, de quebra, ficou famosa na internet.
Pergunto, agora, por que o mito da katábasis é tão frequente na literatura e na mídia? Acho que, na realidade, é muito difícil para nós, seres reais, realizarmos o processo de anábasis (em contrapartida, significando ‘’subir’’), retornar do Reino dos Mortos. Cada vez que ‘’entramos na pior’’, quando pensamos que estamos sem saída, na verdade temos uma oportunidade de visitar o nosso lado obscuro, onde estão nossas mágoas, recalques e defeitos, para darmos uma geral e poder reconhecer nossos erros e voltar mais fortes para o mundo dos vivos. Acredito que seja a partir disso que conseguiremos, de fato, sair da pior e cumprir a jornada de um verdadeiro herói.
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